Fazendo uma busca no Google com marcadores inflamatórios sistêmicos e saúde bucal são obtidos vários sites e textos. A grande maioria é ligada a questão da saúde periodontal. Mas serão estes marcadores somente ligados à especialidade da Periodontia?

Se raciocinarmos que um estado de inflamação bucal de baixa intensidade, crônica ou mesmo aguda, pode levar a uma série de complicações em praticamente todos os tecidos, porque somente a Periodontia (dentro da Odontologia) deveria se preocupar com eles?

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Esse assunto não é novo!!!

Há um século começaram as primeiras associações entre as questões bucais e a saúde geral. O início do séc. XX foi marcado pela teoria da infecção focal, provavelmente pela difusão do uso da radiografia, que deve ter impressionado os clínicos com a presença e fácil visualização das reabsorções ósseas (focos infecciosos) periapicais.

A Cirurgia Oral, devido à disseminação das exodontias, profiláticas ou não, foi então a primeira especialidade odontológica com maior visibilidade no campo do controle das afecções sistêmicas de origem oral.

Logo em seguida a Endodontia, na década de 30, se organizou e se estruturou para fazer do tratamento endodôntico um procedimento confiável, eliminando a necessidade das extrações em larga escala.

Autores na década de 60 fizeram diminuir um pouco a ênfase na idéia do foco infeccioso oral por não encontrarem bactérias viáveis no tecido inflamatório periapical mas, anos depois, esta teoria da inflamação periapical asséptica caiu com as novas técnicas de cultura e evidenciação de microorganismos anaeróbios.

Mais recentemente, a partir dos anos 80, o conceito de correlação bucal com doenças sistêmicas foi revigorado com a publicação de associações entre tecidos periodontais comprometidos e algumas condições como parto prematuro, diabetes, doenças cardiovasculares e pulmonares.

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A Periodontia se encarregou de disseminar este conceito e, assim, tem sido a especialidade que ocupa a linha de frente na valorização da Odontologia para o enfrentamento de doenças que, antes, eram predominantemente abordadas pelo ponto de vista médico.

Mas e as outras especialidades?

Não são inflamações crônicas as que ocorrem nos focos infecciosos periapicais? Nos tecidos pericoronários de um dente semi incluso? Nas mucosites tão comuns causadas, por exemplo, devido a alergias, hiperatividade imunológica, por trauma e também nas de origem microbiológica?

Todo tecido bucal lesado, inclusive cáries, não é porta de entrada ou reservatório para microorganismos?

E vários não estimulam o aumento dos marcadores inflamatórios sistêmicos?

Porque então a endodontia, a cirurgia oral e a estomatologia também não se engajam da mesma forma que a periodontia na confirmação das associações entre doenças bucais e sistêmicas?

Não são os marcadores inflamatórios também alterados nas doenças reumatológicas? Assim, deveria ser comum, por exemplo, que um especialista em tratamento das dores orofaciais pedisse o exame de um marcador inflamatório para averiguar a possibilidade de um quadro sistêmico estar por trás de uma dor neuropática orofacial (como a dor facial atípica ou idiopática), ou de uma osteoartrose da cabeça da mandíbula em um indivíduo jovem, pois tais quadros podem ocorrer em doenças autoimunes como o lúpus eritematoso sistêmico ou na artrite reumatóide respectivamente (incrementando valores de marcadores inespecíficos como o VHS e outros mais específicos*).

Enquanto a Periodontia vai, muito apropriadamente, mudando sua forma de ser para o conceito de Medicina Periodontal, porque as outras especialidades não tiram do armário suas Medicinas adormecidas, tão úteis que seriam para uma melhor visualização e tratamento dos casos?

Teríamos as então as Medicinas Endodôntica, Estomatológica, Odontopediátrica, Odontogeriátrica, Cirúrgica e da Dor Orofacial – ou não seria melhor chamar isso tudo de Medicina Oral?

 

Penso que a Periodontia (e a própria Odontologia como um todo) também seria muito valorizada se unisse esforços com as outras especialidades em suas pesquisas de associações fisiopatológicas buco-sistêmicas, pois aumentariam os valores pró-infecciosos com as afecções não periodontais.

(*) acréscimo em 29/03/2010.